Opinião

Ieda Gomes: GNL, preços e concorrência

As lições aprendidas nos mercados internacionais mostram que é preciso ter oferta abundante e concorrencial, infraestrutura desenvolvida e aberta, para que as leis de mercado possam efetivamente ser aplicadas

Por Ieda Gomes

Compartilhe Facebook Instagram Twitter Linkedin Whatsapp

A conferência LNG 2019, realizada em Shanghai, na China, em abril, comprovou o dinamismo do mercado de GNL, bem como do protagonismo da China – com crescimento galopante da demanda – e dos Estados Unidos, que devem se tornar um dos maiores supridores do combustível na virada da próxima década.

O comércio mundial de GNL atingiu 316,5 milhões de toneladas em 2018, perfazendo alta de 9,8% ante 2017, com 19 países exportadores e 42 importadores.

Uma boa notícia é que os preços continuam em baixa, em função da expansão da oferta. No final de março,
o preço spot na Ásia chegou a US$ 4,40/MMBtu, recuperando para US$ 6,0 em abril, com estimativa de US$ 5,0
para junho de 2019.

Embora o consumo de gás natural já seja equivalente a quase 25% da demanda mundial de energia, persistem incertezas quanto ao futuro dos combustíveis fósseis, em face às metas de descarbonização e ao crescente
ativismo ambiental.

Diante disso, o tom predominante dos líderes empresariais e grandes consumidores na LNG 2019 foi no sentido de otimizar os custos da cadeia de valor, promover a inovação e o desenvolvimento de novos modelos de negócios, além de parcerias ao longo da cadeia.

A China tem surpreendido. Em 2018, o consumo de GNL cresceu 42%, de 38 mtpa para 54 mtpa. Em pouco mais de dez anos, foram construídos 21 terminais de regaseificação, com capacidade para 80 mtpa. O governo planeja que o gás natural ocupe o segundo lugar no consumo de energia em 2030, ultrapassando o carvão. O programa Blue Skies prevê a substituição do carvão por gás em aquecedores domésticos, o fechamento de usinas térmicas e indústrias poluidoras e a ampliação da capacidade de estocagem de GNL.

Os chineses também iniciaram um processo gradual de acesso de terceiros à capacidade de terminais de regaseificação e gasodutos. Além disso, o gasoduto Power of Siberia, de 3 mil km, deve ser concluído neste ano, viabilizando a exportação de até 38 bilhões de m³/ano de exportações russas à China.

A dinâmica do gás natural americano também impressiona. O Departamento de Energia dos EUA projeta,
para 2019, uma produção de gás processado da ordem de 2,58 milhões de m³/d, alta de 9% ante 2018. Com o aumento da oferta, espera-se que os preços em Henry Hub sejam, em média, da ordem de US$ 2,82/MMBtu.
Estamos assistindo a um ciclo vigoroso de oferta de gás natural, com novos projetos de GNL sancionados na
África, Oriente Médio, Estados Unidos e Austrália. Em 2018, foram aprovados empreendimentos totalizando
21,5 mtpa, e a expectativa é que o volume adicionado em novos projetos de liquefação cresça 22% até 2024.

Ante o expressivo crescimento da produção de gás não convencional no país, a Argentina estuda a construção de
capacidade de liquefação de 10 mtpa, mas a idéia esbarra em dois obstáculos importantes. Primeiro, a grande
oscilação da demanda no inverno e verão dificultaria a disponibilização de quantidades firmes de GNL durante
a estação fria. Outro entrave se refere à competitividade do GNL argentino no mercado internacional, dado que
os custos locais relativos a tributos, mão de obra e infraestrutura são elevados.

No Brasil, no âmbito do debate sobre o Novo Mercado de Gás Natural, cogita-se um choque de preços, mas
as lições aprendidas nos mercados internacionais mostram que é preciso ter oferta abundante e concorrencial, infraestrutura desenvolvida e aberta, bem como um mercado dinâmico e crescente, para que as leis de mercado possam efetivamente ser aplicadas.

*Ieda Gomes é uma consultora independente e membro do conselho de administração de empresas internacionais de energia, infraestrutura e certificação. Escreve quadrimestralmente para a Brasil Energia Petróleo

Outros Artigos