Opinião

Um novo cenário para a indústria offshore

Resolução sobre descomissionamento deve priorizar a redução dos riscos e diminuir as incertezas que circundam a atividade

Por Narely Nicolau

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A indústria offshore brasileira vive dois momentos distintos. Ao mesmo tempo que experimenta um ritmo acelerado de crescimento enfrenta o desafio de desativar sistemas de produção e estruturas em campos que já alcançaram sua maturidade exploratória, a exemplo da Bacia de Campos – responsável por mais de 80% da produção nacional.

Neste cenário, os investimentos ligados ao descomissionamento dessas estruturas devem aumentar, alcançando cerca de 50 bilhões até 2040 segundo dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP).

Hoje, ainda de acordo com dados da ANP, 66 instalações offshore no país têm mais de 25 anos de operação e estão em vias de serem descomissionadas. Outras 23 plataformas têm entre 15 e 25 anos de operação, o que reforça a necessidade de uma solução de seguro compatível para atender e viabilizar este novo momento.

Os custos para execução dos desmontes vão se apresentando de acordo com as especificidades de cada projeto, estabelecendo uma função na qual podemos destacar como variáveis: as características técnicas e geográficas, como a extensão e complexidade das malhas de dutos; o arranjo dos equipamentos subsea e, principalmente, a estratégia de desmobilização em conformidade com as condutas regulatórias.

O que seria então preciso para viabilizar a execução dos projetos? A elaboração de um mapeamento preliminar abrangendo todas as variáveis, atribuindo os devidos pesos e correlacionando os impactos, de maneira que possam ser corretamente dimensionadas e controladas para que o objetivo final planejado não seja comprometido ou invalidado.

Por ser uma demanda recente, o Brasil ainda não possui uma diretriz unificada. Para enfrentar a falta de um marco regulatório, as seguradoras buscam uma confluência de entendimentos entre a ANP, o IBAMA, Marinha e os demais agentes, que já avançaram as discussões com uma audiência pública, realizada em janeiro deste ano, que debateu os critérios de decisão a serem considerados na remoção das estruturas e a alienação e reversão de bens.

A experiência de outros países nos aponta que, por conta do impacto negativo sobre a biodiversidade e comercialmente sob a pesca, a retirada completa das estruturas nem sempre se configura como a opção mais adequada. Por isso é importante avaliar outras alternativas, como a remoção parcial apenas do topside, o reboque da estrutura para área determinada e/ou tombamento da estrutura no leito marinho para formação de recifes artificiais, por exemplo.

Aqui no Brasil, a minuta da resolução que foi publicamente debatida pelos órgãos regulamentadores aborda tópicos importantes, que incluem desde a fase de exploração até a interrupção operacional definitiva. Sendo prevista a entrega do Programa de Descomissionamento de Instalações (PDI) à aprovação da ANP, suportado por justificativa técnica quanto à escolha da data do fim da produção. A antecipação do fim da vida útil do campo sem que se esgote todas as formas de recuperação viáveis economicamente, não é recomendada pelo documento.

Também foram apontadas obrigações após a retirada das instalações até o translado ao destino apropriado de descartes e resíduos, bem como a apresentação de um plano de recuperação ambiental para as áreas do ring fence. A resolução em discussão cita ainda representação em carta náutica das estruturas remanescentes, com a finalidade de alertar sobre perigos em trânsitos futuros de embarcações.

Qual o grande desafio da indústria brasileira? Nossas principais reservas estão localizadas em águas profundas, atreladas a complexos sistemas submarinos e de escoamento da produção. Além disso, ainda não é possível gerenciar as expectativas dos custos globais do projeto, uma vez que a questão regulatória se encontra em processo de maturação.

O preço do barril de petróleo quando operado abaixo do esperado como hoje, pode ser interpretado como um acelerador do processo de descomissionamento, uma vez que as tecnologias empregadas na recuperação de campos maduros possam deixar de ser consideradas economicamente viáveis.

Uma das discussões entre os principais players é que a resolução deveria esclarecer de maneira objetiva o início e o término da responsabilidade do operador ao realizar o farm-in/farm-out de seus ativos. Esse é um ponto fundamental para as empresas que adquiram campos maduros não tenham que assumir um passivo maior do que possam suportar financeiramente e as operadoras originais possam dimensionar a extensão de seus dispêndios ao longo do ciclo de vida do campo.

Além disso, é importante ressaltar que houve uma evolução significativa na definição das exigências e restrições para desativação de unidades offshore, porém ainda é preciso uma maior elucidação na definição das melhores práticas a serem adotadas pela indústria em cada cenário.

Sabemos que tal amadurecimento faz parte de uma curva de aprendizado através do compartilhamento de lições aprendidas e da concepção da experiência interpretada e validada sob o contexto Brasil, trazendo as nossas perspectivas sob os arranjos submarinos em águas profundas do offshore brasileiro, não sendo suficiente tropicalizarmos as experiências dos outros países, pois historicamente trabalham em um panorama diferente do que temos aqui, como por exemplo, águas rasas e diferentes condições climáticas.

A expectativa do mercado offshore é chegar a uma resolução convergente, levando em conta todos os riscos do processo; alinhar os interesses socioeconômicos à questão ambiental; priorizar a redução dos riscos e diminuir, com isso, as incertezas que circundam a atividade.

Narely Nicolau de Paula é engenheira de Petróleo, especialista em Sistemas Offshore pela COPPE/UFRJ e Energy Underwriter da Austral Seguradora

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