Opinião

Royalties do petróleo: fim de uma disputa de sete anos

O debate sobre a partilha dos royalties é antigo e continua dependendo de uma decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, que deve julgar a matéria ainda este ano

Por Anderson Dutra

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O que vai ser analisado é a redistribuição do valor arrecadado com essa compensação financeira não apenas do estado produtor do petróleo, mas com todos os municípios brasileiros. Uma discussão que começou em 2012, quando foi sancionada a lei dos royalties. Desde então, o Rio de Janeiro, o principal estado produtor, enfrenta uma luta na Justiça para manter a arrecadação.

Com a nova fórmula que está sendo proposta, a participação especial dos estados produtores passaria de 40% para 20% e a dos municípios produtores cairia de 10% para 4%. Já os royalties seriam reduzidos de 26,26% para 20% e de 25,26% para 4%, respectivamente. Esses recursos seriam redistribuídos por todas as regiões brasileiras e não apenas para os produtores. Para entender o impacto, a cidade de Macaé que recebeu R$ 490 milhões, em 2019, em royalties e em participação especial, receberia R$ 91 milhões com a nova fórmula. Isso teria um grande impacto nas regiões produtoras, já que a maioria delas poderia perder cerca de 80% das receitas.

Pensando na importância do Rio de Janeiro, segunda economia do país e um dos estados que mais contribui para a questão do pacto federativo, sem considerar qualquer aspecto político-administrativo relacionado, mesmo que extremamente relevante no contexto, essa perda poderia impactar diretamente o desenvolvimento da indústria petrolífera na região. O estado do Rio de Janeiro, sozinho, extrai mais de 80% do óleo e mais de 60% do gás do país e, com isso, o estado é o maior produtor de petróleo, o que corresponde a um terço do PIB estadual. Os grandes produtores de petróleo, chamados de “majors companies”, na expressão em inglês, responsáveis por milhares de empregos, possuem matrizes no Brasil localizadas no estado do Rio.

A possibilidade de voltar ao formato anterior de repartição dos royalties ocorre em um cenário desafiador para o governo fluminense e de pandemia no contexto global, o que torna o tema ainda mais sensível, em todos os pontos de vista. Com o novo cálculo, o estado, que está no regime de recuperação fiscal, perde receitas, o que impacta diretamente no pagamento de, por exemplo, despesas previdenciárias (82% destinados ao Rio Previdência), o que não é um problema só do Rio de Janeiro, mas de todo o país. Isso demonstra a falta de planejamento no longo prazo, uma vez que estes recursos deveriam fomentar o período pós petróleo, e não serem usados para pagar despesas correntes. Afinal, o que será de cidades como Macaé e outras altamente dependentes dos royalties advindos deste recurso fóssil?

Além de colocar em xeque as finanças fluminenses, a repartição dos royalties pode ainda gerar uma insegurança jurídica para os investidores da indústria de petróleo, já que o estado deverá tomar medidas duras para o reequilíbrio financeiro das contas. Soma-se a isso, debates históricos sobre a redistribuição de outras fontes como o ICMS, por exemplo, que passou a ser arrecadado no estado consumidor em detrimento do estado produtor, contando com outras contrapartidas. E não podemos esquecer da queda do preço do barril.

Importante destacar que o posicionamento aqui não é contra o debate, muito pelo contrário, a discussão deve ocorrer, ainda mais nesse momento pós-pandemia em que, por exemplo, pessoas estão mudando hábitos de consumo, migrando para cidades mais tranquilas do interior. O debate acerca dos royalties de petróleo deve ser visto de uma forma mais ampla, não fazendo sentido o aumento da receita de um estado em detrimento de um outro, bem como ignorando completamente cidades em outras regiões com potencial de desenvolvimento.

Fomentar o desenvolvimento de determinadas cidades é crucial como ponto de partida e, talvez, repensar a redistribuição direcionada nesse sentido pode ser importante, porém o aumento efetivo da arrecadação de uma determinada cidade ou mesmo região deve estar diretamente relacionado ao desenvolvimento da economia na qual esta mesma região tem vocação e não ao recebimento de royalties de petróleo, até porque estima-se que o pico da demanda de petróleo ocorra por volta de 2035 e que por volta de 2050 mais da metade da matriz global será renovável.

Por outro lado, o mercado de petróleo fluminense nos sinaliza muitas oportunidades já que movimenta bilhões de dólares e milhares de empregos, sendo a maior parcela na cidade do Rio, onde estão as grandes descobertas e novas áreas a serem exploradas. A redução proposta dos royalties na capital não é apenas prejudicial para o estado, mas para o todo o país. Manter acesa a chama da principal indústria da região é essencial para que essa continue sendo protagonista, dinâmica e competitiva nesse momento de retomada e recuperação econômica pós-pandemia. Fica a reflexão.

Anderson Dutra é sócio-líder na área de energias e recursos naturais da KPMG.

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